Os Objetivos do Ensino de Jesus – específicos – 2ª parte

Anteriormente iniciamos o tratamento dos objetivos específicos do ensino de Jesus. Nesse texto queremos dar continuidade, avançando para a percepção de outros objetivos específicos no ensino do Mestre dos mestres.

Jesus tinha o claro objetivo de treinar seus discípulos para continuar o ensino depois dele, isto é, formar discípulos que fizessem novos discípulos (Mt 28.19,20).1 Essa era sua tarefa final, o seu ministério foi dedicado a essa tarefa. Ele ensinou e viveu esse objetivo “O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me a curar os quebrantados do coração, a apregoar liberdade aos cativos, a dar vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor.” (Lc 4.18,19).

Podemos compreender isso com clareza em Mateus 9.35-38: Ele ensinava, pregava e curava (v.35). De forma extremamente habilidosa ele reconhecia a verdadeira necessidade das pessoas: elas pareciam ovelhas sem pastor (v.36a).

No Evangelho segundo Mateus, o motivo de seu ministério torna-se evidente, compaixão. Todavia, ao invés de atender sozinho às necessidades, ele se dirige a seus discípulos (v.37) e lhes diz que orem por mais trabalhadores (v.38).

No capítulo 10 desse mesmo Evangelho, Jesus enviou os seus discípulos para que fossem ao encontro dessas necessidades e realizassem aquilo que ele mesmo havia feito até então. Parece que esse objetivo estava previsto desde o chamado de seus discípulos. É o que encontramos ao ler Marcos 3.14, 15: “E nomeou doze para que estivessem com ele e os mandasse a pregar e para que tivessem o poder de curar as enfermidades e expulsar os demônios”. O processo mais constante em Marcos é o discipulado. É um elemento central dentro do projeto de Jesus. Aprender a viver ou ser como Jesus gastando tempo com ele, observando-o em ação, compartilhando de sua vida, aprendendo com ele e devotando-lhe todo o coração. Discipulado é, pois, a principal atividade que segue o batismo.2

Percebemos que uma dependência na operação da graça de Deus é essencial no processo de ensino. Esses estágios incluem preparo, instrução e avaliação.3 Ressalta-se que existem alguns aspectos interessantes nesse treinamento para o serviço.4 Esses aspectos podem ser descritos com maior riqueza de detalhes.

A associação pessoal com Jesus leva os discípulos a aprenderem mediante o exemplo e a imitação. Esse é o aspecto da observação. A segunda fase vem mediante o ouvir os incomparáveis ensinos de Jesus em várias circunstâncias. É o aspecto da instrução verbal. A terceira fase é a prática, isto é, a experiência direta propriamente dita, quando Jesus lhes confiou serviços práticos concedendo-lhes que batizassem seus (con)servos.

Jesus ainda envia os doze numa excursão de ensinamento e prédica “Tendo convocado os seus doze discípulos, deu-lhes virtude e poder sobre todos os demônios e para curarem enfermidades;” (Lc 9.1). A expressão synkalesámenos “tendo convocado”, designa uma reunião solene e é mais expressiva que o termo proskálesámenos (Mt 10.1) “tendo chamado” e proskaleithai “e chamou” (Mc 3.13). Mas o mais importante a enfatizar é que o motivo principal do envio dos doze pode ter sido a grande miséria do povo, completamente abandonado por seus mestres e líderes. Eles são enviados não para começar, mas para continuar o que o próprio Jesus já começara.5

Depois, Jesus novamente envia seus discípulos. Dessa vez um número de setenta “E, depois disso designou o Senhor ainda outros setenta e mandou-os adiante da sua face, de dois em dois, a todas as cidades e lugares aonde ele havia de ir” (Lc 10.1), mas a missão é semelhante. O fato de que Jesus determina também outros servos pela escolha para o seu serviço, pode ser uma indicação de que essa atividade não era uma prerrogativa do grupo dos doze. Jesus orienta os discípulos a sair em duplas, a fim de permitir-lhes que usufruíssem do benefício da “irmandade”.

Esses dois momentos em que o mestre envia seus discípulos proporcionam a eles uma experiência direta. A quarta fase consiste em uma reunião para ouvir os relatórios dos discípulos, proporcionando-lhes assim direção e supervisão. São as conversas de avaliação.6

Ainda que Jesus agisse espontaneamente e, aparentemente, sem uma sistemática definida, o treinamento de seus discípulos desenvolvia-se passo a passo. Partia da disposição inicial dos discípulos de o seguirem, passando pela fase do aprendizado até chegarem à fase de exercerem o ministério por si mesmos e, por fim, havia momentos em que paravam para uma avaliação.

No discipulado de Jesus ouvir as palavras e ver as obras dele ocupavam um lugar de extrema importância. Olho e ouvido testemunhando fatos de uma vida sem igual era de fato uma excelente preparação para uma futura testemunha. Os discípulos podiam garantir as credenciais para a sua história, somente se pudessem prefaciá-la com a afirmativa: “O que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos…” (1 Jo 1.3a).7

Os discípulos chamados por Jesus o seguiram durante alguns meses, talvez até um ano inteiro, antes de receberem dele alguma tarefa ou serviço. No período inicial do discipulado ouvir e ver, parece ter sido a ocupação principal para eles. Os discípulos eram então como crianças nascidas em um novo mundo, cujo conjunto de lições iniciais consistiu no uso de seus sentidos na observação dos maravilhosos objetos dos quais estavam cercados. Nesse período, Jesus foi para eles, um exemplo vivo daquilo que eles deveriam se tornar. Enquanto Jesus orava e ensinava, os discípulos apenas observavam. A observação passiva dos discípulos é uma característica apresentada especialmente no Evangelho segundo Marcos.8

Antes que Jesus tomasse a decisão de enviar seus discípulos para a prática (Mt 10), pode-se dizer que ele os levou consigo como observadores em uma viagem semelhante “… e percorria Jesus todas as cidades e aldeias…” (Mt 9.35a). Durante essa viagem Jesus ministrava aulas práticas e concretas. Dessa forma, seus discípulos eram instruídos naquilo que deveriam fazer9.

As coisas que os discípulos viram e ouviram eram suficientemente maravilhosas. Jesus Cristo tomou o cuidado de inculcar, em seus seguidores, a magnitude do privilégio que tinham “… Bem aventurados os olhos que veem o que vós vedes. Pois vos digo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vós vedes, e não o viram; e ouvir o que ouvis, e não ouviram” (Lc 10.23-24).

Veja como o discipulado de Jesus contém uma riqueza de objetivos que, depois deverá ser coroado com o recebimento de poder do alto, no dia de Pentecostes, mas, nunca despreza o treinamento e o aprendizado.

 


1 OTT, C. Treinando Obreiros: Princípios Bíblicos, Conselhos Didáticos, Modelos Práticos. Curitiba: Editora Esperança, 2004. p. 31.

2 WATTS, R. E. Jesus, modelo pastoral: estudo do Evangelho de Marcos. Rio de Janeiro: Danprewan Editora, 2004. p. 32.

3 PAZMIÑO, R. W. Deus nosso Mestre. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. p. 41.

4 PRICE, J. M. A pedagogia de Jesus; o mestre por excelência. 2. Ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1975. p. 59.

5 RIENECKER, F. Evangelho de Lucas: comentário Esperança. Curitiba: Editora Esperança, 2005. p. 204.

6 PRICE, J. M. A pedagogia de Jesus; o mestre por excelência. 2. Ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1975. p. 59.

7 BRUCE, A. B. O treinamento dos doze. São Paulo: Arte Editorial, 2005. p. 47.

8 BOICE, J. M. O Discipulado segundo Jesus. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2001. p. 37.

9 OTT, C. Treinando Obreiros: Princípios Bíblicos, Conselhos Didáticos, Modelos Práticos. Curitiba: Editora Esperança, 2004. p. 37.

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